Você sabia que o ovo teve um papel muito importante na forma como os vinhos são conhecidos e consumidos hoje em dia? E que foi por conta dos vinhos que muitas iguarias, à base de ovos foram criadas?
Essa semana vamos explorar essa história, que não tem nada haver com a teoria da evolução de Darwin.
Experimente comprar alguns cachos de uva na feira e espremê-los em um recipiente. Deixe esse mosto fermentar e confira após alguns dias se o resultado vai ser algo parecido com o delicioso líquido chamado “vinho” que consumimos regularmente. Posso lhe assegurar que não.
A “coisa” turva e alcóolica resultante do processo de fermentação irá conter células de fermento mortas (borras), bactérias, tartaratos, proteínas, pectinas, taninos e outros compostos fenólicos, bem como pedaços de casca de uva, polpa, galhos e sementes. Nada apetitosa essa descrição, não é mesmo?
Provavelmente, foi algo parecido com isso que os primeiros humanos que degustaram um vinho, tiveram o “prazer” de beber e não é algo muito diferente da primeira etapa de produção das vinícolas modernas de nosso tempo. Visualmente não é muito agradável, tampouco comercial, apesar de alguns clientes apreciarem vinhos chamados naturais onde nada, ou muito pouco é feito a esse respeito, mas isso é assunto para outro bate papo.
Voltando aos povos antigos...Há muito séculos já era conhecido o poder aglutinante se certos ingredientes naturais, os quais têm a capacidade de _sem ser muito técnico_ aglomerem esses sedimentos em suspenção e que, quando juntos, ficam mais pesados que água, permitindo assim sua precipitação e os tornando mais fáceis de se separar do restante do líquido. Dentre os orgânicos posso listar o sangue animal, caseína derivada do leite, a cola retirada da bexiga dos peixes ou algo de mais acessível e um tanto menos repulsivo chamada CLARA de ovo.
Esse processo de remoção das proteínas e outros sedimentos em suspensão é chamado de afinamento ou clarificação (bem sugestivo, mas o nome não deriva das claras) e é nessa etapa também que o vinho passa por filtros sanitizantes, que impedem a reprodução das bactérias, antes de ser engarrafado.
Crédito: Wine Folly / Sou fã deles, quem sabe um dia não me patrocinem.
São necessárias cerca de 6 claras de ovo para se clarificar uma barrica com 225 litros. Levando em consideração o tamanho e quantidades de vinícolas, mundão a fora, imaginem o que não usavam de claras de ovos...
Mas e as gemas? Ai que nossa conversa fica mais doce!
Os monges dos mosteiros católicos, utilizavam as claras de ovos para diversas funções além da produção de vinhos que utilizavam nas missas, como por exemplo engomar seus hábitos e túnicas e na produção da hóstia. Para não desperdiçarem as gemas desenvolveram muitas receitas de doces com elas, sendo as mais famosas aquelas que foram criadas em Portugal, como o pastel de nata, ovos moles, queijada e o doce Brisa-de-Lis que depois, na mão das escravas aqui no Brasil se tornou o nosso Quindim.
Com o florescimento da indústria vinícola em Portugal, após a instauração do bloquei continental por Napoleão, onde os ingleses passaram a importar quantidades gigantescas de vinhos portugueses e o fechamento dos mosteiros por conta da Revolução Liberal de 1820, muitos empresários viram nos doces uma ótima forma de renda, uma vez que as gemas, sua principal matéria prima, era muito barata. Um deles era brasileiro e sua família é proprietária de uma famosa pastelaria em Belém até hoje.
Atualmente com processos mais rígidos quanto às práticas sanitárias e o crescente pleito da sociedade pelo uso consciente de matérias primas animais, com o veganismo ganhando força nesse meio tempo, o uso de ovos na produção de vinhos vem sendo gradualmente eliminado, sendo as claras substituídas por compostos de argilas chamadas bentonitas e que possuem um grande poder aglutinante e muito eficientes para a clarificação dos nossos amados vinhos.
Por sorte os docinhos continuam por aí, incluindo o mais famoso deles... Os pasteis de Belém, que fazem enorme sucesso com os turistas que vão para Portugal, inclusive com quem vos escreve.
Abaixo deixo alguns links na Amazon, para vinhos portugueses que gosto bastante:
Saúde!
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