Tem uma coisa que eu gosto quase mais do que vinhos: Esportes! Não exatamente de praticá-los, aliás ultimamente tenho sido um grande atleta do levantamento de copo, mas de assisti-los. Sou daqueles que paga a TV a cabo só para ter acesso aos mais diversos canais de esportes. Assisto de tudo, desde o campeonato coreano de baseball ao mundial de atletismo e busco entender as regras e nuances do maior número de modalidades possíveis.
Você meu amigo ou minha amiga leitora, sabe qual a competição esportiva mais assistida no mundo todo? Pode chutar aí a vontade, mas vai ser difícil acertar...
O evento esportivo mais assistido do mundo é a volta ciclística da França ou o Tour de France, que atrai cerca de 3.5 bilhões de espectadores mundo a fora todos os anos, sendo mais visto, inclusive, que a copa do mundo masculina de futebol. Nessa volta ciclística os atletas passam 21 dias, pedalando cerca de 300km por dia, por toda a França e alguns países vizinhos, visitando em muitas etapas as regiões vinícolas e passando ao lado de muitos vinhedos.
Dentre as provas ciclísticas que rivalizam em importância com o Tour de France, talvez a mais importante delas seja a volta a Espanha ou La Vuelta que se iniciou no final de agosto e vai percorrer a maravilhosa Espanha por quase todo o mês de setembro. Uma das características que difere La Vuelta das outras voltas ciclísticas é que ela percorre longos trechos montanhosos, principalmente, ao longo dos Montes Pirineus. Essa ano a quarta etapa terminou em Andorra, um principado “encrustado” nessa cordilheira que faz a divisa entre a França e a Espanha.
Recentemente uma linha de vinhos brancos, alguns dos melhores que eu já provei por sinal, produzidos no sopé dos montes Pirineus, do lado francês, passou a integrar o portfólio da Casavino. A história de como esses vinhos ganharam fama é bem curiosa e é ela que eu vou trazer para vocês na newsletter dessa semana...
A MONTANHA DE HÉRCULES
Os Pirineus, são uma extensa cordilheira localizada na Europa Ocidental, que forma uma fronteira natural entre a Espanha e a França. Essa cadeia de montanhas também se estende por Andorra, um pequeno principado localizado no coração das montanhas. Compreendendo uma distância de cerca de 430 km, os Pirineus são conhecidos por sua beleza cênica, rica história e diversidade geográfica. Nos Pirineus estão localizadas algumas das montanhas mais altas da Europa Ocidental. O pico mais alto é o Pico Aneto, que atinge cerca de 3.404 metros de altitude. A cordilheira também é caracterizada por uma série de picos, vales profundos, rios e lagos glaciais, oferecendo uma ampla variedade de paisagens naturais.
O nome da cadeia montanhosa advém do grego e segundo a mitologia grega, após a morte de sua esposa, Pirene, Hércules teria erguido uma tumba à altura de seu amor, isto é, a cordilheira, onde repousa sua amada. Os Pirineus têm uma história rica e variada, marcada por culturas celtas, romanas e medievais. Por separar a península Ibérica do que hoje em dia é França, além de um “escudo” natural nas guerras, a região foi um importante ponto de passagem para comércio e migração ao longo dos séculos.
Muitos vestígios históricos, como castelos e igrejas antigas, podem ser encontrados nas áreas montanhosas e ao sopé da montanha se encontra nossa região de destaque: Limoux. Como no caso do nome da cadeia de montanhas, foram os gregos que introduziram o cultivo de vinhas na região, por volta do século V antes de Cristo, porém a região ganhou fama por seus vinhos quase 2000 anos depois quando um estilo único de vinho surgiu.
Limoux é uma comuna francesa na região administrativa de Occitânia. Está localizada próxima à Toulouse e após os montes Pirineus. Ao sul estão Andorra e a divisa com a Espanha. À leste as águas do Golfo de Lion e o Mar das Baleares refrescam a região com seus ventos. Essa mistura de altitude, frio, grande exposição solar e a e influência marítima criam um terroir único para a produção de uvas e vinhos, principalmente as brancas, e é justamente nesse microclima único é que nascem os vinhos Toques et Clochers.
Além do “Carnaval de Limoux”, uma grande festança celebrada todos os anos no inverno, a região é famosa por suas históricas torres de sinos. São cerca de 42 torres, espalhadas na região, que geralmente ficam ao lado de igrejas e capelas, sendo que na antiguidade eram utilizadas para sinalizar, através das badaladas dos sinos, os horários do dia aos camponeses, bem como sinalizar eventos importantes, como, por exemplo, a aproximação de inimigos ou o falecimento de alguém da região.
O SENHOR DAS BORBULHAS
Existe uma lenda, muito comum entre os amantes de vinhos, de que foi o Monge Don Perignon que inventou os vinhos espumantes na região de Champagne por volta do ano 1650. Na verdade, o monge beneditino só aprimorou o método, criado mais de 100 anos antes, pelos monges da abadia de Saint-Hilaire, justamente nos arredores de Limoux. Nessa época, por volta de 1530, a região era uma potência econômica e o senhor da região o Sieur d'Arques, um grande amante dos vinhos espumantes, chamados no dialeto local de Blanquette, da região de Limoux, encomendava gigantescas quantidades desse vinho para celebrar suas vitórias com seus conterrâneos.
Quase quatro séculos depois, em 1938, foi criada a denominação de Origem AOC Blanquette de Limoux, uma das primeiras da França e pouco tempo depois da segunda grande guerra mundial, os produtores de vinhos da região resolveram se juntar e criaram uma grande cooperativa chamada Société Des Producteurs de Blanquette de Limoux. Mesmo sem um renome mundial de igual magnitude do Champagne, os espumantes da vinícola e da região fizeram muito sucesso, ganhando diversos prêmios e sendo muito consumidos dentro da França.
A principal uva utilizada nos espumantes de Limoux, sempre foi a Chardonnay, entretanto, apesar de naturalmente as uvas já terem uma qualidade incrível por conta do terroir da região, os produtores somente criavam vinhos simples com ela, pois este era utilizado somente como vinho base para os espumantes.
Uma mudança importante passou a ocorrer no início da década de 1980 quando os viticultores associados começaram a produzir seus vinhos bases Chardonnays em parcelas únicas e as que mais se destacavam passaram a ser vinificadas em ínfimas quantidades, como um vinho tranquilo e que passou a chamar a atenção dos grandes connoisseurs da época.
Amantes de Chardonnay do mundo todo passaram a desejar esses maravilhosos vinhos brancos, mas como a produção era pequena e não dava conta de atender a demanda, em 1990 a cooperativa passou a organizar uma festa popular, onde era realizado um leilão de vinhos como intuito de arrecadar fundos para ajudar na conservação e restauração daquelas torres de sinos e capelas, as quais comentei anteriormente, da região.
Nesse mesmo ano a Société Des Producteurs de Blanquette de Limoux, honrando a tradição histórica dos grande banquetes de celebração, mudou o seu nome para o mesmo daquele que foi uma das pessoas mais importantes da região o: Sieur d'Arques.
O BANQUETE DOS SINOS
A cada ano uma cidade é escolhida para sediar o evento e ter sua torre e igreja restaurada. Um chef de cozinha famoso é convidado para conduzir o leilão e preparar um banquete. O primeiro chef convidado de honra, foi Pierre Troisgros, pai do “quase nosso” Claude Troisgros, que também já conduziu o evento. O evento recebeu o nome de Toques et Clochers. Toque é o nome dado aos chapéus dos chefs de cozinha e Clochers significa sinos em francês.
Desde então o evento Toques et Clochers, que ocorre na mesma semana do Domingo de Ramos, passou a ser uma das mais importantes datas do mundo do vinho, atraindo entre 30 e 50 mil visitantes todos os anos. Chefs, restaurateurs, sommeliers, fornecedores e clientes de diversas partes do planeta se encontram e celebram os grandes vinhos Chardonnays da região. Durante o final de semana de festividades, além do tradicional leilão beneficente, ocorrem também um grande jantar de gala para 400 convidados conduzido por um chefe três estrelas Michelin.
Durante o festival, regado a muito vinho branco ocorrem também um desfile de produtores e confrarias vestidos a caráter, mostras artísticas onde designers e pintores expõem seus trabalhos sendo que todo ano um é escolhido para estampar um lote com 120 garrafas de espumantes que são leiloadas junto aos Chardonnays.
Abaixo deixo alguns links na Amazon para esses maravilhosos vinhos:
Ouço sinos na minha cabeça. Talvez seja o Chardonnay que degusto enquanto escrevo esse texto, mas um vinho criado por produtores de espumantes, vendido em uma festa, chega para uma empresa que vende espumantes para festa...só pode ser um sinal dos pontos se conectando no universo...
Saúde a todos!
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