O Decanter é um acessório para vinhos controverso. Para quem está começando a se aventurar no mundo do vinho, pode parecer um preciosismo ou, em uma linguagem mais direta, uma “frescura” dos que se dizem entendidos da bebida ou daquele sommelier que no restaurante quer impressionar algum cliente especial. Entretanto, somente quem já experimentou degustar um vinho, com certo tempo de envelhecimento, que passou algumas horas aerando em um decanter sabe a diferença que esse processo confere ao sabor dessa bebida.
Um encontro ocasional levou um engenheiro elétrico americano ao seu momento Eureka, transformando sua vida empreendedora e proporcionou aos amantes do vinho um dos acessórios mais legais e uteis para a bebida. O Vnturi se utiliza de um princípio formulado por um físico italiano do qual a indústria automobilística usufruiu por muito tempo para aprimorar os motores a combustão interna e que há algum tempo já está em desuso, mas foi responsável pelas alegrias de muitos jovens apaixonados pela velocidade.
Apesar de bebidas e carros serem uma combinação extremamente perigosa, nesse post vamos explorar o que um físico italiano, um engenheiro elétrico americano, o carburador de um “Dojão” e nossa tão apreciada bebida têm em comum.
O DECANTER E O ENGENHEIRO.
Um decanter é uma grande jarra de vidro _melhor se for de cristal_ onde um vinho é depositado depois de aberto e que tem duas funções principais. A primeira, como o nome sugere, é decantar sedimentos que possam se formar com o tempo no vinho ou que estejam presentes na bebida quando ela não é filtrada, evitando assim que estes não caiam nas taças antes de o consumidor degustar seu vinho.
A segunda, e a meu ver mais importante, é aerar o vinho. Dentro do decanter um vinho tem uma superfície maior do que dentro da garrafa para que o oxigênio entre em contato consigo e nesse processo o vinho consegue, após alguns minutos ou horas, exibir toda a sua complexidade aromática, literalmente se revelando uma bebida completamente diferente da qual seria se degustada logo após a abertura da garrafa.
Aqui vale uma observação. Tanto no processo de decantação quanto o de aeração os resultados são mais bem percebidos em vinhos que tenham passado por algum tempo de envelhecimento. Em vinhos mais jovens, normalmente filtrados, passar o vinho pelo decanter, não irá causar dano algum a bebida, porém os benefícios serão mínimos.
O problema do uso do decanter, além dos preços estratosféricos que alguns modelos podem adquirir, todo esse “ritual” é bem demorado. Esperar uma ou duas horas para dar um gole, quando se está com aquela sede de um bom vinho pode ser uma tortura para alguns, inclusive para a pessoa que vos lhes escreve.
Para o engenheiro elétrico californiano Rio Sabadicci, essa espera também o incomodou. E muito...
Rio não era lá um grande apreciador de vinhos. Vivendo na Califórnia, uma das Mecas do vinho, no início dos anos 90, bebia ocasionalmente algumas garrafas de vinhos simples, mas nunca cultivou um grande interesse na bebida. Seu amor maior era o empreendedorismo ligado a tecnologia na crescente indústria de softwares do vale do Silício. Mas tudo mudou quando em um encontro com um cliente, pode degustar uma garrafa que esteve decantando por algumas horas e o sabor que sentiu naquele momento foi algo único. Uma experiência tão prazerosa que criou um interesse enorme pelos vinhos.
Mas acostumado com a “correria” do mundo tech, Rio não aguentava esperar horas para tomar seu vinho da maneira correta e foi nesse momento que começou a vislumbrar uma forma de contornar aquele processo moroso e em um momento de Eureka, enxergou no efeito Venturi uma forma de entregar ao vinho toda a complexidade proporcionada por uma aeração, mas que ocorresse quase que instantaneamente. A resolução dessa dor, mudou sua vida, porém como já vimos por aqui, o sucesso de um empreendedor nunca vem desacompanhada de alguns percalços e desafios com potencial de envinagrar a vida daqueles que não são obstinados o bastante para perseguirem seus sonhos.
Partirmos do princípio...Literalmente!
O FÍSICO E O MOTOR.
É bem provável que o padre e físico italiano Giovanni Battista Venturi, curtia um vinhozinho de sua terra enquanto desenvolvia seus estudos sobre as mecânicas dos fluídos no final do século XVIII. O que ele não sabia é que seus estudos revolucionariam a forma como nos locomoveríamos um século e meio depois e que de ”lambuja” deixaria nossos vinhos mais gostosos quase 200 anos após o fim de sua passagem nessa vida.
A vida de Giovanni, foi bem interessante, mas vamos focar na sua descoberta. O efeito Venturi.
Basicamente, _os físicos e engenheiros que me perdoem pelo resumo_ um fluido, quando em movimento dentro de um duto uniforme se comprime momentaneamente ao encontrar uma zona estreita, diminuindo sua pressão e, aumentando sua velocidade ao atravessar a zona estreitada e, se neste ponto, for introduzido um terceiro duto, ocorrerá uma sucção do fluido contido nessa ligação misturando ambos os fluídos.
Esse princípio é largamente usado na engenharia e diversos equipamentos, de extintores de incêndio à máquinas odontológicas se valem do efeito Venturi em sua concepção, mas foi a indústria automobilística que o utilizou em grande escala para o melhor funcionamento dos veículos até o final do século passado. Os carburadores dos automóveis, que foram gradativamente substituídos por injeções eletrônicas, operavam aspirando o carburante por efeito Venturi, misturando-o com o ar, ao passar por um estrangulamento.
E foi justamente nesse sistema que Rio, baseou sua invenção, o Vinturi. No seu dispositivo o vinho é misturado com o oxigênio enquanto é derramado da garrafa para a taça, gerando assim uma aeração “turbinada” recriando em segundos o que demoraria horas em um decanter. Um acessório que se tornou um objeto de desejo de muitos amantes de vinho, por conta de sua eficácia e praticidade, sendo que seu sucesso comercial mudou a vida de Rio e guinou sua carreira, mas esse sucesso não veio sem muitos desafios.
O CARBURADOR E O AERADOR.
Mesmo após muito trabalho de desenvolvimento, a primeira versão de seu aerador, não foi lá um grande sucesso para Rio. Apesar de feedbacks muito positivos quanto sua eficiência, era um trambolho de quase um metro de altura onde dentro um tubo o vinho pingava por diversos canos e ia aerando no caminho. Rio que a essa altura tinha largado seu emprego em uma indústria de software para se dedicar ao empreendimento ligado ao vinho, pensou em desistir diante das negativas do mercado em relação ao seu produto que era desengonçado e de difícil limpeza.
Quase que sem querer, quando pesquisava sobre os processos de fabricação de cervejas, o engenheiro americano se deparou com a utilização do efeito Venturi para a optimização da qualidade das “geladas” e por estar familiarizado com o conceito teve aí o insight para aplicar o mesmo princípio na aeração dos vinhos. Pouco tempo depois contatou um colega que trabalhava na área de desenvolvimento de motores da Chrysler, onde esse lhe ajudou com a criação da forma e do modelo do Vinturi.
Muita engenharia e pesquisa de materiais foram necessárias para o desenvolvimento do modelo final, mas que quando pronto se mostrou um grande sucesso de vendas que posteriormente, levaram à criação de novas versões, incluindo uma para vinhos brancos e um aerador com o mesmo princípio que é inserido diretamente no gargalo da garrafa.
Os vinhos são como as pessoas. Alguns chegam a velhice com muita vitalidade e outros mesmo com pouca idade já estão decrépitos, mas se você, meu caro leitor, nunca provou um vinho de qualidade com certa idade, depois de ser aerado em um decanter ou no Vinturi, se dê de presente esse pequeno deleite. Lhe garanto que você não vai se arrepender, em que sabe esse encontro pode mudar também a sua vida.
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Saúde!
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